segunda-feira, 5 de outubro de 2009

OS INDIOS.


 Também vieram de longe
 e plantaram raízes
 imemoriais
 no jardim de sua eleição
 desde a diáspora primeva
 da Criação.  

 Não sabemos se temos
 a mesma origem
 ou se nascemos já divididos
 disputando o mesmo espaço.  

 Descimentos e preamentos
 bandeirantes
 dizimaram e escravizaram
 índios sem religião
 como animais
 errantes.   
 Os sobreviventes estão
 confinados em reservas
 como num zoológico humano.  

 Duas culturas não podem
 ocupar o mesmo lugar:
 ou o índio é integrado
 à sociedade
 e perde a identidade tribal
 ou refugia-se na comunidade.

 Garimpeiros, pecuaristas
 seringueiros e extrativistas
 avançam com moto-serras.  

 O índio não é ambicioso
 nem ocioso.  

 A terra é a existência do índio
 terra de todos, comunitária
 terra que é partícula
 em movimento e assimilação.  

 Terra e índio: um vive da outra.
 Mãe e filho, indivisíveis.  

 Terra sagrada
 de húmus vivo e fértil
 de seus antepassados
 com que o índio abona
 o inhame, o cará e a taioba.  

 Em que cultiva, caça e pesca
 e colhe, apenas quando
 e quanto necessita.  


 Para o índio não há amanhã
 em qualquer sentido pois
 o tempo não existe
 em sua percepção:
 o movimento do corpo
 num ímpeto contínuo
 é que move a rede
 (e não os pés e a mão)
 como move a vida.  

 Dias alternam-se sem
 alterações e altercações
  de pesca, de fruta acesa
 que logo vai compartilhar
 no complemento do beiju
 do pirarucu e do tucunaré.  

 O fogo está sempre aceso
 na aldeia e almas intermitentes
 de dormir e despertar
 de morrer e renascer:
 um tempo dentro de outro
 tempo infinito e cego.  

 Fogo feito para irmanar-se
 depois de buscar a lenha
 que não armazena jamais
 para não quebrar a rotina.  

 Um grande poder de concentração
  e de dedicação extrema-
  com todo o tempo do mundo
 mas sem a noção de tempo.



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